Como o Fair Play Financeiro afetaria o futebol brasileiro? Quem estaria em desacordo atualmente?

Sports Value vem estudando os dados do futebol brasileiro há décadas, e vivemos um momento importante, com o debate sobre o Fair Play Financeiro no Brasil.

Nossa visão é que é essencial a criação de regulação financeira no futebol brasileiro e o melhor mecanismo de regulação utiliza uma análise transversal de dados financeiros e fluxo de capitais.

O Fair Play Financeiro na Europa sofreu muitos “dribles” com patrocínios inflados de empresas ligadas aos times dos magnatas, por exemplo.

Brasil pode aprender com os acertos e debilidades de diferentes modelos mundiais e estabelecer uma regulação moderna, que vise o crescimento saudável da indústria

Qual o melhor modelo de Fair Play Financeiro para o Brasil?

Modelo criado na Europa foi bem-sucedido inicialmente, focando principalmente na redução dos prejuízos dos clubes, que foram de € -1,7 bi em 2011. Ano após ano foi sendo revertido até alcançar lucro de € 579 milhões, 6 anos depois em 2017.

Os mais de 600 clubes europeus analisados pela UEFA voltaram a gerar prejuízos em 2019, e sofreram ainda mais com a pandemia.

Prejuízos +600 times europeus- € milhões

Fonte: UEFA

Brasil deveria se inspirar nesse modelo e proibir gastos e injeções de recursos fora do orçamento anual dos clubes, limitando os prejuízos.

Para a Sports Value o modelo ideal de Fair Play Financeiro é esse transversal, analisando diferentes dados financeiros e índices:

1. Controle rígido dos déficits

A regulação de um Fair Play Financeiro no Brasil deve buscar o déficit zero, isso significa respeitar orçamentos pré-estabelecidos pelos clubes de forma formal e sistêmica.

A visão da Sports Value é usar a experiência europeia, com seus erros e criar um controle mais rígido dos prejuízos.

Assim o ideal é que as perdas líquidas médias dos últimos 2 anos não ultrapassem R$ -20 milhões.

Aplicando a análise para o Brasil com dados de 2023 e 2022, fica clara a necessidade de uma regulação efetiva, especialmente pelo perfil descontrolado dos gastos das SAFs.

Fonte: Sports Value

Botafogo SAF, Vasco da Gama SAF, Bahia SAF, Grêmio, América-MG SAF estariam com déficits médios nos últimos 2 anos acima de R$ -20 milhões.

4 SAFs somaram perdas de R$ -748 milhões em dois anos, por falta de regulação.

Botafogo SAF: Acumulou perdas de R$ -349 milhões em dois anos.

Vasco da Gama SAF Acumulou prejuízos de R$ -212 milhões em dois anos.

Bahia SAF Acumulou perdas de R$ -144 milhões em dois anos.

América SAF Acumulou prejuízos de R$ -43 milhões em dois anos.

2. Controle dos gastos com futebol

Um outro aspecto de análise para o Fair Play Financeiro, depois dos prejuízos, é a análise dos gastos com futebol sobre a receita total.

Para a Sports Value o índice de 73% dos gastos com futebol sobre a receita pode ser considerado como um limite seguro.

Clubes menos endividados e com ausência de gastos excessivos com o clube social pode alcançar perto de 80%. Mas são raros os casos.

Índices muito elevados indicam gestão desequilibrada e risco para a saúde financeira da Industria do futebol

Quais os clubes brasileiros têm altos índices de Custo com Futebol/ Receitas?

Análise da Sports Value sobre os balanços dos clubes de 2023 mostra que em média os TOP 20 clubes do Brasil têm índice Custo Futebol / Receita de 81%.

Nesse caso boa parte do futebol brasileiro estaria acima de 73%.

Somente Internacional, Corinthians, Cuiabá SAF, Santos, Athletico-PR e Flamengo apresentaram índices até 73%

Índice Custo Futebol / Receita- Em %.

Fonte: Sports Value

Botafogo SAF e Bahia SAF estão com índices acima de 100%, um descalabro! América MG SAF e Vasco SAF acima de 90% e Atlético-MG SAF com 89%.

3. Endividamento controlado

Finalmente, um terceiro elemento importante para o Fair Play Financeiro é o controle concreto do endividamento líquido dos times.

O cálculo do endividamento líquido:

Dívida Líquida = Passivo total – Ativo CirculanteAtivo Realizável

A história financeira dos clubes comprova que esse é o melhor mecanismo de análise de índices de endividamento no Brasil. Já que os clubes utilizam as receitas de venda de jogadores para compor o EBITDA. (Lucros antes de despesas financeiras, impostos, depreciação e amortização).

Assim, no Brasil o fluxo de caixa a ser gerado depende de uma receita extraordinária, que são as transferências. No EBITDA somente deveria conter as receitas ordinárias, sem as transferências.

Desse modo, o endividamento sobre receitas indica facilmente quais os clubes estão em situação mais complicada no Brasil.

Para a Sports Value, na regulação de um Fair Play Financeiro, o índice não deveria ser superior a 2,0 A média dos TOP 20 clubes do Brasil em 2023 está em 1,15.

Índice Dívida Líquida / Receita

Fonte: Sports Value

Atlético-MG SAF, Cruzeiro SAF, Internacional, Vasco da Gama SAF e Coritiba SAF estão com indicador igual ou acima de 2,0.

O que o presidente da LaLiga falou das SAFs?

Recentemente em Buenos Aires no evento Sportel, o presidente da LaLiga da Espanha, Javier Tebas, respondeu a um questionamento do sócio da Sports Value, Amir Somoggi, sobre a criação das SAFs no Brasil, sem qualquer regulação.

Sua resposta foi contundente:

“De nada adianta criar SAF sem um efetivo controle financeiro da gestão dos magnatas. A Europa viveu essa era de prejuízos absurdos, por falta de controle, e a situação só melhorou com o Fair Play Financeiro. Sem regulação, magnatas gastam, com salários altíssimos e contratações, sem se preocupar com orçamento, colocando em risco a saúde financeiro de todo o ecossistema do futebol”.